Bonifácio deixou em casa seu notebook, prendeu as orelhas enormes com um clipe, beijou a foto secreta que até hoje não me mostrou e saiu.
Levava consigo uns binóculos minúsculos, daqueles de teatro, e me disse que ia observar pássaros, pois precisava fugir um pouco das crises políticas, das mentiras, dos não sei, dos não vi, dos não estava lá, dos ninguém tem prova, dos estão me perseguindo e assim por diante. Comentou que a melhor coisa que tinha visto nos últimos tempos tinha sido uma bengala sendo baixada nos ombros de um deputado, naquele momento caçado e a seguir cassado.
Saiu, pois, em busca dos pássaros, mas não sem antes perguntar onde foram parar as verdes matas representadas no, hoje, mais auri do que verde pendão da adotada pátria amada.
Ao fim do dia, voltou.
Cansado e bronzeado, até onde um rato pode pegar um bronze, estava com o olhar radiante. Havia encontrado muitos pássaros na sua excursão, mas de cara foi dizendo que o que mais o fascinara havia sido o João de Barro.Passara por garças em banhados, cardeais saltitantes, pardais nem se fala, pica-paus e por andorinhas fazendo verão na primavera.
Mas estava interessado no Furnarius rufus, nome cientifico do seu novo amigo, o João de Barro. Estava um pouco encabulado de comparar seu ninho, afinal um ninho de ratos, com a bela casa arquitetada com a lama e protegida das intempéries por seu desenho característico, com a porta sempre voltada no sentido contrario dos ventos predominantes da região. Aliás, a construção de abrigos elaborados é típica da família Furnaridae : os primos Cochicho e Lenheiro usam a madeira, o Batebico usa o junco e o João Pedreiro, como diz seu nome, as encostas pedregosas.
Com voz forte e enérgica, embora nada musical, se comunicam de maneira estridente.Suas penas são de cor marrom ocre e cor de tijolo.
E conquistaram a admiração do Bonifácio, que tratou de encontrar uma foto do novo amigo e com ela decorou seu ambiente ao mesmo tempo em que fez uma arrumação caprichada em seu ninho.
Abaixo a foto usada pelo nosso ratinho.